Sacramento do Amor
Por: Rosa, R. Rafael.
Hoje, 11 de fevereiro, solenidade em honra a Nossa Senhora de Lourdes, testemunhei um momento que ficará gravado em minha memória e no meu coração. Estava na casa de uma família de paróquianos, participando da Santa Missa, todos envolvidos diante de uma atmosfera de fé, religiosidade e sagrada devoção que permeava o ambiente. Na melodia suave e harmoniosa dos cânticos acompanhados pelo violão, e sobre a mesa singela onde Jesus Eucarístico seria entregue a todos pelas mãos do Santo Sacerdote, o cheiro suave das flores misturava-se ao som das orações feitas pelos fiéis, que subiam ao céu como oferta agradável a Deus, enquanto as vozes se uniam em louvor. Mas foi durante a comunhão que a verdadeira essência do Mistério se revelou a nós.
Uma travesti se aproximou da Mesa Sagrada. A figura dela, que poderia facilmente ser ignorada ou marginalizada por parte da sociedade, ali representada, trouxe consigo uma presença marcante e um grande anseio por Jesus Eucarístico. Ao vê-la se aproximar, meu coração acelerou, e meus olhos não se conteram. O sacerdote transbordava misericórdia e amor, sem expressar qualquer julgamento; com um sorriso no rosto, entregou-lhe Jesus Sacramentado e, com um gesto sutil e reconfortante de acolhimento, disse mais do que as palavras que proferira durante sua homilia. Ali, naquele instante, enquanto todos contemplávamos o grande Mistério da Paixão e Morte do Senhor, pude ver na pessoa do sacerdote o próprio Cristo se fazendo presente. Ele não estava apenas na hóstia e no Cálice consagrado; Ele estava na sacralidade do amor diante daquela mulher que desafiava todos os tipos de estereótipos e preconceitos existentes.
Enquanto eu adorava Jesus no Sacramento da Comunhão, observava a cena e fui agraciado com uma visão profética: percebi que muitos dos presentes, ainda que em reverência, não se "ajoelhavam" diante da Eucaristia. Alguns o faziam em respeito ao rito, mas era visível que a verdade lhes faltava. Mas, aquela travesti, com um gesto de entrega e humildade, foi a única a se ajoelhar de fato diante do Senhor. Ajoelhou-se de corpo e de coração; seu ato simples e profundo ecoou como um hino de fé em um mundo cercado pela indiferença, pela arrogância e altivez; onde tantas vezes nos esquecemos da compaixão e do senso de humanidade.
Naquele momento, durante a comunhão, lembrei-me das palavras do profeta Jeremias: "As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos!" E pude compreender que é muito fácil nos perdermos nas nossas próprias certezas, com meias verdades, vontades e interesses cheios de intolerância e separações de Deus e do nosso próximo. Ali estava uma lição viva do amor real manifestado e presente. Todos somos dignos da graça e da misericórdia do Senhor; todos são dignos de receber também o amor maternal da Virgem Maria Santíssima, entendendo que não há lugar melhor para estar do que na casa da mãe.
Com um sorriso no rosto, a travesti iluminou o ambiente e contagiou a todos com tamanha alegria ao receber em seu íntimo, a grandeza de um Deus que partilha conosco. Foi como se a esperança e a aceitação ressurgissem em sua vida.
A celebração continuou, mas algo dentro de mim já havia mudado. A cena daquela travesti ajoelhada diante do Sacerdote que ministrava Jesus me fez refletir sobre o verdadeiro significado da comunidade cristã: um espaço onde todas as pessoas devem ser bem-vindas sem exceções; onde o amor transcende as barreiras sociais e nos lembra da humanidade que compartilhamos.
Na noite de hoje, aprendi que a misericórdia divina não tem limites nem fronteiras e que cada encontro com Jesus é uma oportunidade de vivenciá-la plenamente.
Desejo que possamos sempre nos lembrar de abrir nossos corações para receber um Deus Grande que se faz pequeno para morar dentro de nós.
Graças e louvores se dêem a todo momento: ao Santíssimo e Diviníssimo Sacramento, o Sacramento do Amor!
Arte: Cláudio Pastro | Imagem retirada da internet.